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Carnaval e Gestão da Propriedade Industrial: O Desfile das Marcas Registradas

Atualizado: 7 de mar.


Ilustração gerada por IA - DALL-E
Ilustração gerada por IA - DALL-E

O Carnaval brasileiro é uma das maiores expressões culturais do país e um motor econômico que movimenta bilhões de reais anualmente. Contudo, a ausência de proteção legal sobre nomes, símbolos e expressões carnavalescas tem levantado disputas jurídicas que ameaçam a identidade de blocos e escolas de samba.


Neste contexto, a Propriedade Industrial surge como uma ferramenta essencial para garantir a autenticidade, o reconhecimento e a sustentabilidade dessas manifestações culturais. O evento movimenta cerca de R$ 8 bilhões anualmente, sendo um dos principais eventos culturais do Brasil. O Rio de Janeiro, por exemplo, arrecadou aproximadamente R$ 4,5 bilhões apenas em 2023, incluindo turismo, publicidade e vendas de produtos relacionados [1]. No entanto, muitos blocos e escolas de samba não registram suas marcas, abrindo espaço para exploração comercial indevida. A história do registro de marcas no carnaval do Rio de Janeiro tem como pioneira a Estação Primeira de Mangueira. Segundo Pereira [2], “a pioneira nos registros foi a G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, que é também a escola com maior número de depósitos, 20 depósitos, realizados entre 1984 e 2003.” (PEREIRA, 2018, p. 49).


A Estação Primeira de Mangueira segue mostrando sua força não só na avenida, mas também na proteção de sua identidade. Com 13 registros de marca ativos em 2025, a escola lidera entre os Grêmios Recreativos Escolas de Samba (G.R.E.S.) quando o assunto é propriedade industrial. Mais do que gestão da propriedade industrial, a preservação de sua marca reflete o cuidado com sua história e o reconhecimento de seu valor no mercado cultural. Como mostra a Tabela 1, a Mangueira concentra a maior parte de seus registros na categoria de serviços, com 9 marcas, além de contar com 2 registros na categoria de produtos e 2 na categoria de produto e/ou serviço, garantindo exclusividade sobre o uso de seu nome em diferentes segmentos.


Tabela 1 - Marcas em vigor segundo a natureza da atividade econômica por Escola de Samba do Grupo Especial 2025 (até 02/2025)

Registro de marca em vigor                           

24

De serviço                                                    

16

G.R.E.S.  ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA

9

G.R.E.S.  GRANDE RIO 

3

G.R.E.S. UNIDOS DO VIRADOURO 

2

G.R.E.S.  BEIJA FLOR

1

G.R.E.S.  MOCIDADE INDEPENDENTE DE PADRE MIGUEL

1



De produto

2

G.R.E.S.  ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA

2



De produto e/ou serviço

6

G.R.E.S.  GRANDE RIO

3

G.R.E.S.  ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA

2

G.R.E.S.  ACADÊMICOS DO SALGUEIRO

1

Fonte: INPI. Elaborado pelo autor (28 fev. 2025)

 

O crescimento dos registros de outras escolas, como a Grande Rio, que aparece com 6 marcas ativas em 2025, evidencia um movimento mais amplo de profissionalização e valorização da propriedade industrial no carnaval. No entanto, os números da Tabela 1 reforçam o pioneirismo da Mangueira, que segue na vanguarda quando se trata de proteger sua marca e ampliar sua presença para além do desfile, consolidando-se como um dos maiores ícones culturais do país.


Entre os registros de marca da Estação Primeira de Mangueira, há uma diversidade de proteções que vão além do nome principal da escola. Na Tabela 2, estão listadas as marcas nominativas atualmente em vigor, incluindo variações como MANGUEIRA, ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA e BATERIA DA MANGUEIRA, reforçando a exclusividade sobre termos diretamente ligados à sua identidade. A Tabela 3 apresenta as marcas mistas e figurativas já registradas, enquanto a Tabela 4 destaca aquelas que ainda estão em análise, abrangendo setores como entretenimento, atividades culturais e até vestuário.


Tabela 2 - Marcas Nominativas da G.R.E.S. Estação Primeira Mangueira em vigor (em 28/02/2025)

MANGUEIRA

ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA

MANGUEIRA DO AMANHÃ

VELHA GUARDA DA MANGUEIRA

BATERIA DA MANGUEIRA

BOUTIQUE VERDE E ROSA

A VERDE-E-ROSA

Fonte: INPI. Elaborado pelo autor (28 fev. 2025)

 

  

Tabela 3 - Marcas Mistas e Figurativas da G.R.E.S. Estação Primeira Mangueira em vigor (em 28/02/2025)

Marca mista nº 811572668

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Marca mista nº 825728240

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Marca mista nº 918960061

[ * ]
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Marca figurativa nº 917819934

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Marca figurativa nº 917820134

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Marca figurativa nº 918959977

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Fonte: INPI. Elaborado pelo autor (28 fev. 2025)

 [*] NCL(11) 41 - Educação, provimento de treinamento; entretenimento; atividades desportivas e culturais. Especificação: Serviços de caráter desportivo, recreativo, social, cultural, comunitário, filantrópico e beneficente, sem finalidade lucrativa, todos os serviços incluídos nesta classe.


Tabela 4 - Marcas Mistas da G.R.E.S. Estação Primeira Mangueira em análise (em 28/02/2025)

Marca mista nº 937595365

[ ** ]
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Marca mista n° 937596329

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Marca mista nº 937596485

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Fonte: INPI. Elaborado pelo autor (28 fev. 2025)

[**] NCL(12) 25 - Vestuário, calçados e chapelaria. Especificação: Acessórios para cabeça [Chapelaria]; Chapéus [Chapelaria]; Bonés; Camisas, Camisetas, Calças, Bermudas, Sandállias, Chinelos, Vestido, Saias, Vestuário, da Classe 25.

  

A ausência de proteção formal sobre a identidade de blocos e escolas de samba tem permitido que empresas registrem seus nomes e imagens sem autorização, explorando comercialmente a cultura popular sem garantir retorno aos verdadeiros criadores. A prática, destacada por Matos [3], evidencia a fragilidade desses grupos diante das regras do mercado.


Casos de disputa por nomes no Carnaval já se tornaram recorrentes. Em 2018, um dos blocos mais tradicionais do Rio de Janeiro foi proibido de usar seu próprio nome porque uma empresa havia registrado a marca previamente. A solução? Uma batalha judicial longa e onerosa para tentar reaver o direito sobre a sua marca, reforçando a importância da proteção legal [2]. Outro caso importante foi o da Escola de Samba Gaviões da Fiel, que que perdeu parte do controle sobre sua marca em produtos licenciados devido à falta de um contrato claro com patrocinadores. Sem uma gestão eficiente de propriedade intelectual, a escola viu sua identidade atrelada a terceiros sem a devida contrapartida financeira [4].


O descuido na formalização de registros não apenas abre brechas para a apropriação indevida da identidade cultural, mas também gera disputas judiciais desgastantes e compromete estratégias de monetização dos blocos e escolas de samba. Um problema antigo, mas ainda negligenciado [5]. O Carnaval brasileiro é um ativo cultural e econômico que precisa de proteção jurídica para preservar sua identidade e garantir benefícios aos verdadeiros criadores. O registro de marcas e a gestão eficiente da Propriedade Intelectual são ferramentas essenciais para que blocos, escolas de samba e artistas possam evitar a exploração predatória e construir um modelo sustentável de negócios.


Educação e Profissionalização no Carnaval: Parcerias Acadêmicas e Oportunidades para a Propriedade Industrial


O carnaval e o samba têm se aproximado do meio acadêmico por meio de diversas iniciativas educacionais e parcerias institucionais. Destaca-se o Instituto do Carnaval, criado em 2005 pela LIESA e Universidade Estácio de Sá, que oferece o curso de graduação Gestão do Carnaval e mantém parcerias com escolas de samba para estágios. A Universidade Veiga de Almeida também contribui com um curso de pós-graduação em Figurino e Carnaval, abrangendo desde a criação de fantasias até técnicas de beneficiamento têxtil. Além disso, a Casa da Ciência da UFRJ tem colaborado com o carnavalesco Paulo Barros no desenvolvimento de enredos. No campo da formação profissionalizante, o Império Serrano firmou parceria com a Firjan, Senac e empresas patrocinadoras para oferecer cursos especializados voltados à produção de barracão. Paralelamente, muitas escolas de samba promovem oficinas informais de ensino para crianças e adolescentes em áreas como música, dança e ateliê [3]. No entanto, embora haja uma crescente profissionalização do carnaval, a Propriedade Industrial ainda não aparece como tema central nessas iniciativas. A inclusão da PI poderia fortalecer a proteção de criações carnavalescas, como figurinos e adereços, além de auxiliar na gestão de marcas e na proteção da inovação tecnológica no setor.


O Carnaval Precisa de Propriedade Intelectual


Como um espetáculo de alcance global, o Carnaval deve ser reconhecido como um ativo cultural e econômico que merece proteção. O registro de marcas e a gestão da Propriedade Intelectual são ferramentas essenciais para que blocos, escolas de samba e artistas preservem sua identidade e assegurem sua sustentabilidade a longo prazo. A valorização estratégica desses bens pode abrir novas oportunidades econômicas e fortalecer a identidade das comunidades envolvidas no carnaval. Portanto, reconhecer e proteger esses ativos intangíveis significa investir no desenvolvimento social e na preservação da cultura brasileira, garantindo que as escolas de samba continuem desempenhando um papel essencial como expressões vivas do patrimônio nacional.


Assim como um enredo bem contado conquista a Sapucaí, uma estratégia de PI bem elaborada pode transformar o Carnaval em um case de sucesso em gestão da cultura e dos negócios. Dessa forma, o Carnaval pode ser não apenas um espetáculo de cores e alegria, mas também um case de sucesso na gestão da cultura e dos negócios.

A gestão da Propriedade Industrial envolve a identificação estratégica dos ativos que podem ser protegidos, sua valoração e a definição das melhores formas de exploração comercial. Compreender esses elementos é essencial para transformar inovação em vantagem competitiva e desenvolvimento econômico.


Se você se interessa por esses temas e deseja aprofundar seus conhecimentos, convidamos você a se juntar ao nosso grupo de pesquisa em Gestão da Propriedade Industrial e Inovação.

 

Oportunidade para Pesquisa:  nosso Grupo de Pesquisa em Gestão da Propriedade Industrial e Inovação tem disponibilidade para orientações de Estágio Pós-Doutoral (processo contínuo), Mestrado e Doutorado, com vagas previstas no Edital 2025 para ingresso em 2026. 



Referências


[1] OLIVEIRA, Loana Barbosa de. Carnaval do Rio de Janeiro e blockchain: essa combinação dá samba?. 2024. 48 f. Dissertação (Mestrado em Administração) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Administração, Rio de Janeiro, 2024.


[2] PEREIRA, Larissa de Souza. Preservação e inovação no Carnaval Carioca: uma análise econômica dos mecanismos de promoção, apropriação e financiamento. 2018. 120 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Ciências Econômicas) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Ciências Econômicas, Rio de Janeiro, 2018.


[3] MATOS, Marcelo G. Pessoa de; SOARES, Camila; DOMINGUES, Célia; GONZALO, Manuel. O sistema produtivo e inovativo do Carnaval Carioca: construção de competências e políticas sistêmicas para seu desenvolvimento sustentável. Revista Pymes, Innovación y Desarrollo, v. 4, n. 1, p. 58–94, jan./abr. 2016.


[4] DIAS, Paola Lisboa Côdo. Sob a “lente do espaço vivido”: a apropriação das ruas pelos blocos de carnaval na Belo Horizonte contemporânea. 2015. 201 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Arquitetura, Belo Horizonte, 2015.


[5] BOSCHI, Marcelo Rosa. O Carnaval como fenômeno de atração e retenção de turistas na cidade do Rio de Janeiro: um olhar sobre grupos distintos de foliões de blocos da Zona Sul da cidade. 2007. 120 f. Dissertação (Mestrado Executivo em Gestão Empresarial) – Fundação Getulio Vargas (FGV), Rio de Janeiro, 2007.

 


Importante: O presente texto apresenta as opiniões pessoais do autor, as quais não devem ser interpretadas como o posicionamento oficial de qualquer instituição à qual ele esteja vinculado.

 
 
 

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